Muito se fala hoje de educação. O povo cobra escolas melhores, os professores lutam por melhores salários e condições de trabalho, o governo anuncia a cada ano mais verbas , porém na prática o que vemos é que as mudanças não acontecem.
Estudei em escola pública, na década de 60, quando essas eram as referências em padrão de ensino. Depois, me transferi para uma conhecida escola particular, tradicional, rígida, e isso me deu condições de aprendizado para ousar voos mais altos.
Mas, se olharmos à nossa volta hoje, o que encontramos? A educação pública aos frangalhos, às vezes as estruturas escolares até são de boa qualidade, porém os professores estão despreparados ou desmotivados. Em algumas partes do país, as escolas não dispõem de nenhuma estrutura física, os professores trabalham por amor - recebem salários irrisórios - e não vemos nenhuma expectativa de mudança nos métodos utilizados, parece que não há mesmo interesse algum em que nossos jovens aprendam a serem verdadeiros cidadãos, que eles aprendam para se tornarem bons profissionais.
Já o ensino particular parece que baixou os seus níveis para se adequar ao público. Paralelamente, o ensino privado hoje se tornou uma mercadoria, entregue para aqueles que podem pagar bem por ela.
E quanto ao futuro? O que devemos esperar? Como obter essas tão necessárias mudanças?
Reproduzo aqui um artigo escrito pela Jéssica Simões, estudante de pedagogia, de quem tive a honra de ser professor.
Com muita simplicidade e lucidez, a Jéssica nos mostra claramente o que e como devemos buscar.
Fica aí a esperança de dias melhores !
Educação e contemporaneidade
O papel principal da educação é o de formar cidadãos conscientes de seus atos, humanizá-los para conviverem em sociedade,respeitando as opiniões diferentes da sua, fazendo a relação entre o que é ensinado na sala de aula e o que ele vivencia fora dela. Fazemos então uma relação entre a educação quando ainda era aplicada como paidéia ¹ na Grécia e a educação na atualidade.
Se pararmos para pensar, a educação vem mudando o seu objetivo de acordo com o tempo, pois na Grécia sua educação era classificada como paidéia , onde havia o desejo de se realizar uma educação completa, não só no sentido religioso, mas de forma geral. Não se tem uma definição única para paidéia, mas muitos a classificam com o sentido de propor a felicidade entre a sociedade, onde havia a troca de informações dos mais experientes para os jovens. Sócrates e Platão nesta época utilizavam o método de levar os indivíduos a pensarem nas respostas de suas próprias perguntas. Essa forma de fazer com que o individuo pense é nomeada como Maiêutica. A educação paidéia respeitava o conceito de dimensão superior, ou seja, o homem não se importa só com o corpo,mas com o seu lado espiritual,pois para eles não é somente nasceu, viveu , morreu e acabou.
Diferentemente dos conceitos da educação paidéia, a educação moderna gira em torno do capitalismo, onde a sociedade a classifica como algo primordial, pois é a partir dela que o individuo irá conseguir um emprego.É preciso que o individuo se qualifique cada vez mais fazendo cursos, faculdades, para conseguir um trabalho classificado como “bom” onde terá uma “renda salarial” melhor, para conseguir viver em meio a uma sociedade que se importa mais com o “ter” do que com o “ser”.
Escutamos sempre a mídia falando sobre “ EDUCAÇÃO DE QUALIDADE” mas na verdade não é isso que presenciamos , muitas escolas não possuem uma boa estrutura, não há a exploração dos saberes culturais que seus alunos possuem, alguns professores se consideram incapazes de dominar os conteúdos que devem ser transmitidos de maneira clara ao seus alunos, fazendo com que eles pensem em como chegar ao resultado daquele assunto. E por não conseguir acabam por adotar a educação bancária como o principal método de ensino , o que torna suas aulas monótonas e mecânicas, fazendo com que haja a desistência dos alunos. Sem contar na quantidade de crianças que não tem acesso a escola pelo fato de já estarem lotadas.
Essa educação de qualidade pode ser que seja o que as indústrias consideram como maior lucro, pois quanto mais trabalhadores capacitados mais lucro para a empresa.
Pode-se pensar na probabilidade de que esta educação de qualidade esteja voltada para que haja a igualdade na sociedade. Mas como haver igualdade se não há cursos profissionalizantes o bastante para todos? Para se conseguir ter acesso a uma faculdade ou curso gratuito é necessário que o individuo passe por uma prova imposta pelo governo ( um exemplo é o ENEM).Mas como esse aluno de escola pública que não sabe nem estruturar uma redação simples ,pois na escola isso não é muito explorado quando na verdade o correto seria que desde as séries iniciais os professores já incentivá-los a escrever , alunos que muitas vezes voltaram para casa por causa da ausência do professor ou até mesmo por desinteresse pelas aulas serem tão monótonas, por precisar trabalhar para ajudar em casa,a disputa com alunos de colégios particulares que tem aulas mais rígidas e condições de pagar uma faculdade particular mas querem concorrer com os menos favorecidos, por estas e diversas outras razões hà a dificuldade para esses alunos conseguirem ingressar numa faculdade com a nota do ENEM.
O governo não se importa se você possuiu ou não aquelas disciplinas durante todos os seus anos de estudo, ele só impõe o que realmente deveria ter sido passado, pois o sistema escolar possui uma grade curricular imposta pelo governo com todos os conteúdos que devem ser seguidos, mas como o tempo é curto e muitos professores não o aproveitam de maneira correta, acaba por prejudicar os alunos da rede pública.
Para concluir faço uma citação do que Malala diz em uma entrevista à BBC “A MELHOR MANEIRA DE SUPERAR OS PROBLEMAS E LUTAR CONTRA A GUERRA É ATRAVÉS DO DIÁLOGO”.
Se quisermos que haja a modificação deste quadro onde a educação ainda é vista de maneira desvalorizada é necessário que isso comece nas salas de aulas, com os professores conversando com os seus alunos sobre o que realmente estamos vivenciando, fazendo relação entre o que é ensinado e o que está acontecendo fora das salas de aula, fazendo com que seus alunos obtenham um saber mais critico que saiba opinar nas decisões de seu governo.
Pois como Malala mesmo cita “ O maior defeito do nosso governo é achar que virá um próximo e consertará” , se pensarmos assim, nunca irá haver uma mudança, pois vivemos em torno de procurar melhorias para nós mesmos, quando na verdade ao assumir o papel de político o que deveria ser feito é pensar no coletivo na melhoria do país em geral. Quando os governantes perceberem que seus cidadãos já sabem dos seus direitos, começando a cobrar do governo o que é preciso mudar, haverá de certa forma uma mudança. Se o indivíduo chega a ser GOVERNANTE, ou a qualquer outro cargo político é porque a SOCIEDADE permitiu que esse cidadão chegasse a esse cargo, e somente a sociedade pode fazer com que o mesmo não preencha mais esse cargo.
Não é necessário que haja uma confusão para se conseguir isto, e necessário que a sociedade saiba dialogar entre si de forma crítica para mudar este quadro de desleixo tanta na educação quando no modo de vida em geral dos cidadãos menos favorecidos.
Jéssica Simões
Estudante de Pedagogia
¹ Paidéia - Segundo Werner Jaeger (2001), Paidéia era o "processo de educação em sua forma verdadeira, a forma natural e genuinamente humana" na Grécia antiga. O termo também significa a própria cultura construída a partir da educação. Era este o ideal que os gregos cultivavam do mundo, para si e para sua juventude.