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sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Acabar com as cracolândias?






                                                                                    Por: Fernando Marin


   Desde a década de 90, a região central da cidade de S.Paulo começou a se tornar palco de um fenômeno que está se tornando nacional. Foi o início da chamada ‘cracolãndia’, onde um grupo de dependentes dessa droga assassina chamada crack  se reúne para adquirir e consumir a droga, quase que livremente. Com o tempo, esse grupo se transformou em uma verdadeira multidão que vaga pelas ruas sem destino, unidos apenas pelo vício desenfreado e pela necessidade constante do consumo de mais uma ‘pedra’.

   Em pouco tempo, toda aquela região se degradou. O comércio fechou as portas, prédios foram abandonados e depois invadidos pelos dependentes, as ruas se tornaram território do tráfico, inviabilizando a vida normal naquela região.

   A prefeitura fez o que pôde – muito pouco – para colocar ordem na área. No ano passado, a polícia tentou desocupar o espaço público, porém, apenas conseguiu dispersar aquela multidão, que passou a ocupar outros espaços na cidade, gerando descontentamento da população .

   Nada do que foi feito surtiu resultado, com exceção de uns poucos projetos, principalmente o bancado pela igreja Batista, chamado Cristolândia, que tem dado atendimento àqueles que o aceitam e já conseguiu êxito em retirar das ruas muitos  que viviam pelo vício.

   Mas, o que era exclusivo de S.Paulo, agora já se espalhou por outras cidades. No Rio de Janeiro, já há áreas também tomadas pelos dependentes, que apesar de todos os esforços do poder público ainda dominam as ruas e avenidas, colocando vidas em risco e causando problemas à população e ao comércio em geral.

  A sociedade cobrou medidas efetivas para que se resolvesse essa verdadeira epidemia, que ceifa vidas e destrói o futuro de jovens e crianças, porém, nada do que se faz surte algum efeito positivo. Na verdade, parece que não há nenhum plano traçado que possa realmente vir a gerar resultados , já que não se sabe o que pode ser feito para se combater efetivamente o tráfico e o consumo do crack, droga que vicia logo ao primeiro uso e que destrói vidas em poucos meses.

  Depois de muita inércia e de discussões conjuntas, as autoridades resolveram pela internação compulsória, como forma de afastar das ruas aqueles dependentes que expõem suas vidas à risco ou que estejam procedendo de forma violenta, além das crianças que são protegidas por legislação específica.

  Me parece que, a prioridade traçada hoje, é acabar com as ‘cracolândias’ da forma mais simples,  afastando as pessoas de lá, varrendo ‘para baixo do tapete’ um problema de âmbito nacional e para o qual o governo se mostra totalmente despreparado para resolver, por falta absoluta de meios para isso. Apesar do consumo de drogas estar em permanente acréscimo, os órgãos governamentais não estão devidamente capacitados, seja materialmente ou em número de profissionais, para lidarem com a questão, e só agora, com a pressão popular, estão tentando fazer algo que vise a ‘mostrar serviço’ à sociedade.

   O tratamento da dependência química é complexo, a droga deve ser combatida conjuntamente com ações paralelas, para que produzam os efeitos desejados. Quando alguém busca ‘conforto’ nas drogas, é porque algo vai errado em sua relação familiar, ou social. Assim apenas afastar o dependente do uso da droga, não resolve a questão que o levou ao vício. Terminado o tratamento de desintoxicação, o trabalho deve ter continuidade na reinserção do dependente na vida cotidiana, para que ele não mais necessite buscar a droga, fazendo com que que se sinta amparado e cuidado pela família e demais entes sociais. Caso isso não venha a acontecer,  se não tiver um amparo familiar ou de alguma entidade que o acolha, o indivíduo acabará voltando às ruas e ao uso das drogas novamente, num círculo que nunca terminará.

   Assim, para realmente se fazer algo que venha a afastar as pessoas desse vício nefasto, é necessário que se crie uma estrutura que possa atuar de maneira a reinserir os egressos do tratamento na vida social, oferecendo moradia, trabalho, estudo, uma oportunidade de futuro para que os ex-usuários se sintam amparados pela sociedade. Há alguns exemplos positivos, como o da prefeitura de São Bernardo do Campo, que tem tido êxito na recuperação de usuários de drogas, através de um acolhimento e acompanhamento de reinserção social.

   Na verdade, o melhor seria a prevenção, com ações efetivas que afastassem, principalmente os jovens, do risco do vício. Porém, nossa sociedade tem se mostrado incompetente para evitar que o uso de drogas aconteça de forma descontrolada, até porque vê os drogados como um estorvo, algo que incomoda, que prejudica, e não como pessoas que estão doentes e necessitando de cuidados para sair dessa situação.

   Com certeza, família, amigos e religião, são pontos fundamentais para afastarem alguém das drogas . A religião, por  dar sentido a vida, cria objetivos a serem alcançados, o que estimula a autoestima e sacraliza a nossa existência, gerando uma experiência com Deus e nos religando com Aquele que nos criou ,nos ama e com quem nos encontraremos ao final da atual etapa da vida. 

   Com certeza, uma espiritualidade que viesse do seio das famílias, uma sociedade menos consumista e materialista, tudo isso aliado a uma ação mais eficaz da igreja, seriam pontos importantes para afastarem as pessoas desse vício tão nefasto e destrutivo.

Fernando Marin

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Enfrentar ou liberar as drogas ?




                                                                                     Por: Fernando Marin



   Uma das maiores preocupações da sociedade, hoje, é sem dúvidas a questão do consumo das drogas. Principalmente, o das chamadas “não lícitas”,  que tem trazido uma série de malefícios, mortes e, principalmente,  vem incrementado a marginalidade, justamente pelo seu aspecto de ilicitude.

   Pouco se tem feito com vistas a controlar essa verdadeira epidemia que está cada vez mais destruindo vidas. Na  verdade, nem se sabe o que fazer, já que essa dependência tem cura a partir do momento em que o dependente toma uma decisão pessoal de deixar o vício. Já se partiu, inclusive , para a internação compulsória, como forma de esvaziar as “cracolândias” que se espalham pelas nossas cidades, embora sem muitos resultados positivos nem perspectivas de um futuro melhor.

   Na verdade, creio, pessoalmente, que a única maneira de se erradicar esse mal seria acabar de vez com o tráfico  a nível mundial, embora eu mesmo saiba das dificuldades em se conseguir essa solução, mesmo a nível local.

   E aí que aparecem sugestões para que se descriminalize o uso da maconha, droga tida como de efeitos leves, mas, no meu entendimento, uma porta de entrada para o consumo das chamadas drogas pesadas, como a cocaína e a pior de todas elas, o crack, fácil de se obter e barato, acessível a todas as classes sociais, e justamente  a mais perigosa . Os defensores da legalização da maconha alegam que seu consumo já deixou de ser crime em vários países do mundo e em alguns estados norte-americanos, e que essa legalização acabou com a criminalidade que envolve o tráfico.

   Porém, lendo o jornal O Globo, do dia 31 de dezembro último, me deparei com um artigo, escrito pelo deputado federal Osmar Terra (PMDB-RS), que, em um sério trabalho de pesquisa, desmistifica toda essa questão, e demonstra claramente que a criminalidade, nesses lugares, até aumentou depois da legalização. Por isso, transcrevo o artigo, para que todos possam tomar conhecimento dele e formar opinião sobre essa verdadeira carnificina que se abateu sobre toda a sociedade mundial.

Enfrentar ou liberar as drogas?

   O dilema entre enfrentar ou liberar as drogas no Brasil exige mais do que uma opinião ideológica ou sociológica sobre o tema. Exige conhecimento da história, das pesquisas científicas mais atuais, do porquê e como um ser humano fica dependente das drogas, das políticas públicas e da experiência das famílias que vivem esse drama.

   Sem pretensão de fazer aqui um tratado sobre o tema, posso dizer que um ponto central desse conhecimento científico sobre as drogas, e que é rigorosamente ignorado pelos defensores da liberação, é o de que a dependência química produz uma mudança estrutural, definitiva, no cérebro humano.

   Fruto do estímulo continuado da droga, é produzido um novo tipo de memória de longo prazo da sensação causada, com novas conexões entre os neurônios no centro de recompensa cerebral, e que permanecerá para o resto da vida. Obedecendo a um mecanismo ancestral de sobrevivência, essa estrutura modificada passa a comandar a motivação do dependente e irá direcionar seus interesses e ações na busca da droga, em detrimento de todas as demais atividades. Mesmo tratado, o dependente recairá de forma cíclica, e a vitória maior será mantê-lo em abstinência prolongada. Assim funciona com qualquer droga. Do cigarro ao crack, passando pelo álcool e a maconha. Todas atuam na mesma região do cérebro com as mesmas consequências. O que varia é a rapidez e a intensidade com que isso acontece.

   Tais alterações, depois de estabelecidas, caracterizam uma forma de doença crônica, até agora incurável, e que exigirá cuidados médicos permanentes. Junto com isso, temos um percentual elevado de portadores de alguma outra forma de transtorno mental (ao redor de 20% da população), que são muito mais vulneráveis À dependência química do que os não portadores. A Organização Mundial da Saúde (OMS) produziu um livro com consensos científicos internacionais sobre o assunto, “ Neurociência do uso e da dependência de substancias psicoativas” (Editora Roca), que pode ser consultado.

   Na minha opinião, como médico estudioso do assunto, como secretário estadual da Saúde que fui por oito anos no Rio Grande do Sul e ex-presidente do conselho Nacional dos Secretários de Saúde, afirmo que estamos diante do mais grave problema de saúde pública e de segurança no Brasil. A progressiva liberação das drogas produzirá uma oferta ampliada e multiplicará rapidamente o número de dependentes. Criaremos uma enorme legião de doentes crônicos, com dificílima readaptação a uma vida produtiva. E com custos humanos e financeiros extraordinários para o Brasil.

   Entendo que a liberação seria muito mais desumana e onerosa para o país que qualquer forma de enfrentamento ao tráfico.

   Até porque, liberadas, as drogas seriam “traficadas” por grandes indústrias e teriam uma oferta colossal.

   Todos os países que liberaram as drogas, como a Suécia, até 1969, e a China, no século XIX, tiveram que voltar atrás, em função dos problemas sociais e de segurança, e tem hoje leis duríssimas sobre o assunto. As experiências pontuais de liberação parcial do uso como a de Portugal fracassaram, aumentando o número de dependentes em tratamento e multiplicando os homicídios. Vide relatórios do Instituto Nacional de Administração (INA, dezembro de 2004), do governo português. Ao contrário do que afirmam os defensores da liberação, nos países que tomaram medidas mais firmes contra o consumo de drogas, como a Suécia e EUA, houve diminuição de dependentes e de homicídios. Desde a década de 80 os homicídios caíram pela metade nos EUA e na Suécia morrem assassinadas 30 vezes menos pessoas, proporcionalmente, que no Brasil. Em outras palavras, se aqui tivéssemos as taxas de homicídios da Suécia, 48 mil pessoas deixariam de morrer assassinadas a cada ano.

   Com essa visão, e acompanhando o sofrimento de muitas famílias é que me motivei a propor as mudanças na lei sobre as drogas, enfrentando, e não liberando seu consumo. Elas deverão ser votadas ainda no primeiro semestre de 2013 na Câmara dos Deputados.

Osmar Terra